Como surgiu esta paixão pela Psicologia? 12º ano de escolaridade, 17 anos de idade, iniciar-me aos estudos da Psicologia no Curso Científico-Natural na pequena localidade de Vila Nova de Foz Côa. Lembro-me que todos os temas eram absorvidos com uma vontade e gosto que nunca tinha experimentado. O livro acompanhava-me para todo o lado; não considerava que estudava, apenas que lia por real paixão em querer saber mais. A decisão de me candidatar à licenciatura em Psicologia no final daquele mesmo ano foi imediata. Seis opções e todas em Psicologia para vários locais do país. Ingressei na primeira opção – Universidade do Minho em Braga.
Os cinco anos de estudos foram pautados por altos e baixos na motivação perante as disciplinas. Haviam conceitos que me faziam sentido, outros não. No estágio curricular senti-me impotente e incapaz de ajudar tanto quanto queria e tinha sonhado. Duas primeiras pacientes que jamais esquecerei – uma com 18 anos e com diagnóstico de demência devido a um acidente de viação; – uma menina de 8 anos, linda e encantadora, vítima dos problemas de casal e relacionais dos pais, naturalmente depressiva e contida numa solidão que lhe custava verbalizar e até exteriorizar.
Desde então senti que precisava estudar mais, aprofundar os meus conhecimentos pois que a psicoterapia sempre foi uma área de máximo gosto e que, apenas com a Licenciatura, sentia não saber como fazer, que técnicas utilizar. Fiz Pós-Graduação em Psicoterapia/Ludoterapia e Neuropsicologia por dois anos, em Lisboa, conciliando funções de formadora do IEFP, outra paixão.
Tive uma oportunidade de trabalho em Leiria em 2011 onde pratiquei tudo aquilo que tinha aprendido ao longo da minha formação. Desde então, por todos os casos que me surgiram, quer crianças, adultos ou idosos, pela sua complexidade e unicidade, permitiram-me crescer nesta área, ganhando confiança e segurança. Tive que me superar em cada situação, lidar com as emoções dos outros que, por muitas vezes me emocionam também, momentos dificeis em que uma palavra minha podia mudar certos contextos de vida… é um trabalho de uma responsabilidade tremenda pois chegam-me até ao consultório pessoas frágeis e fragilizadas, emotivas e arrasadas, mas também sedentas de uma esperança, de uma mudança, disponibilizando todo o seu tempo e vontade nessa emergência em sair do desespero que as invade. Não consigo ser indiferente e olhar cada rosto em lágrimas como apenas mais um caso, mais “um número”. Fala-se na “indiferença afetiva” que carateriza os profissionais de saúde ao longo dos anos de carreira; ainda não o senti e orgulho-me disso. Creio que só sentindo as emoções do outro, entregando-me também a esses sentimentos, consigo compreender melhor e ajudar melhor. Tem alturas que saio das consultas com dores de cabeça, voltas no estômago, má disposição, problemas digestivos e pesar. Lidar com isto creio que, isso sim, fui mudando ao longo do tempo. Hoje em dia consigo “superar” com maior rapidez os sintomas emocionais que me afligem no trabalho a dois, com o paciente. Consigo descentrar-me quando chego a casa e estou junto da minha família. É uma caraterística essencial para me manter afetivamente sã.
Contudo, fui-me apercebendo de alguns “entraves” da Psicologia, não que me decepcionassem, pois que aceito e percebo que qualquer terapia tem as suas lacunas e não pode resultar para todos os casos, mas que me frustam numa vontade que não se cumpre, num desejo não alcançado. São exigidos dos pacientes, além do seu tempo e dinheiro, o mais importante: empenho e disciplina. A minha atuação e o meu sucesso estão condicionados pela vontade, esforço e garra do paciente em se superar. “Quando um não quer, dois não dançam”, no sentido em que a psicoterapia é resultado do esforço conjunto de duas pessoas, a desejarem o mesmo, a objetivarem o mesmo, a caminhar na mesma direção. Apercebi-me que só com um grau de sofrimento muito elevado é que um paciente se move em direção em mudança e solicita ajuda. Aquilo que mais fugimos e assusta – o sofrimento -, é também a alavanca que trás melhores e mais felizes perspetivas. A psicoterapia é o motor que impede que este sofrimento se desenrole a um ponto de ruptura física e emocional. Consegue-se dentro de uma relação de empatia, segurança e confiança no psicoterapeuta e também no futuro.
Clara Conde
26-03-2017
Gostei muito de conhecer o seu percurso. Beijinhos e muitos parabéns.